12/05/2013

Vale um céu de presente?


                                                Ilustraçao de Mirian Malzyner
                                             
Maria estava desolada hoje, a minha babá, ô coisa esquisita nessa altura da vida, ter uma babá! Minhas duas filhas na Austrália, não poderiam vir. A bisnetinha, filha de Sara (a neta que tem meu nome), não conheço, dizem ser igualzinha a mim, na velha foto velha que carregaram.
Fiz noventa anos redondos, para que mais festa? Já me festejaram demais esse ano, grande coisa, noventa anos! Pra que Natal, agora?
Maria me enxerga sozinha. Sozinha! Tanta gente nova ligou...os velhos estão cá dentro, morreram, caducaram, ih! quase meia-noite. Maria deixou no forno uma lasanha de berinjela, arroz integral com passas e nozes, ainda me deu um porta-retrato, com o salário que tem! Eu lhe dei dinheiro, ela bem precisa, sei, sem marido, e filharada...
O vizinho do 703 é sozinho, queria festejar, gosta de conversar ... A do 705 queria me juntar com o pai do marido (que não gosta da mãe dela). Recusei os dois: quero ficar quietinha na varanda, olhar o céu, comer a comidinha da Maria, com meu Malbec e pensar comprido – em quem já foi, na família que se espicha lá longe, no Jorge! Jorge! Tantos natais! sou semente? Queria de Natal, escuta aí Jorge: comer...beber...espalhar as fotos da nossa família, deitar na cama e...dormir devagarinho...e... ...não ´tá na hora de me recolher a raiz? Jesuisinho, me ouve? Quero um céu de Natal.
          Maria Luiza Salomão

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